Uma pesquisa, publicada no Brazilian Journal of Physics, revelou que o vírus SARS-CoV-2 utiliza o colesterol presente no corpo para se multiplicar, alterando a estrutura da lipoproteína de baixa densidade (LDL), partícula responsável por transportar o colesterol pelo sangue. Essas mudanças podem favorecer o acúmulo de placas nas artérias, elevando os riscos de doenças cardiovasculares.
A pesquisa combinou técnicas de física, biologia molecular e bioquímica para analisar o impacto da COVID-19 no colesterol LDL. Os resultados mostraram que, durante a fase aguda da doença, ocorre a formação de partículas de LDL menores e mais oxidadas. Além disso, essas alterações persistem por até seis meses após a alta hospitalar, mantendo os pacientes em risco mesmo após a recuperação da infecção.
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O professor Antônio Martins Figueiredo Neto, do Instituto de Física (IF) da USP e coordenador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Fluidos Complexos (INCT-FCx), explicou que o grupo de pesquisa já trabalhava com fluidos complexos, como cristais líquidos, desde 1982. “Temos técnicas experimentais que analisam as propriedades ópticas de materiais, que foram aplicadas a sistemas biológicos. Inicialmente, avaliamos as características de partículas de LDL oxidadas in vitro”, relatou ao Jornal da USP.
Em 2005, uma colaboração com pesquisadores da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP permitiu a aplicação dessas técnicas para estudar o comportamento da LDL. Na época, foi identificado um marcador de partículas com alto teor de oxidação e baixo conteúdo de antioxidantes, o que já indicava um potencial risco para a saúde cardiovascular.
Com o início da pandemia em 2020, os pesquisadores decidiram investigar como o vírus da COVID-19 poderia modificar a LDL. “Alguns estudos preliminares mostraram que pacientes infectados com menores concentrações de LDL-c (colesterol associado à LDL) tinham um pior prognóstico clínico”, explicou Figueiredo Neto. Para aprofundar a investigação, foi necessário um novo estudo, que reuniu médicos e profissionais de saúde do Hospital Universitário (HU) da USP.
A professora Nágila Damasceno, do Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP e uma das coordenadoras do trabalho, destacou que o objetivo era verificar se a qualidade da partícula LDL era afetada pela infecção aguda da COVID-19. “Também queríamos saber qual seria o comportamento em pacientes recuperados”, afirmou.
Em condições normais, o colesterol transportado pela LDL é essencial para o remodelamento e a síntese de novas membranas celulares. No entanto, o excesso de colesterol e as modificações oxidativas criam um ambiente propício para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares. “No contexto da pandemia, ninguém entendia o papel dessa partícula”, completou Damasceno.
Os resultados do estudo mostram que a COVID-19 não apenas altera a estrutura da LDL, mas também cria um cenário de risco prolongado para os pacientes. A persistência dessas alterações por meses após a infecção sugere que os sobreviventes da COVID-19 podem precisar de monitoramento cardiovascular contínuo, mesmo após a recuperação.
Com informações Jornal da USP