Nos cadernos e livros das crianças, a maioria dos heróis brasileiros, escritores e descobertas revolucionárias ainda são de personagens brancos. “Isso é muito ruim para a gente. Nossas crianças e jovens da comunidade são pessoas pretas que precisam reconhecer nossas histórias e heróis,” diz Rose Meire Silva, 46, liderança da comunidade quilombola Rio dos Macacos, em Simões Filho (BA).
Mesmo sendo analfabeta, Rose se informou sobre a Lei 10.639, que há 22 anos tornou obrigatório o ensino de cultura afro-brasileira nas escolas. Determinada, ela passou a visitar escolas próximas para cobrar um currículo mais inclusivo. Atualmente, as crianças percorrem 14 quilômetros para chegar às escolas. “Elas andam tudo isso e, às vezes, ficam decepcionadas com o que ouvem em sala de aula. Tem professores que nem tocam nas temáticas dos negros e quilombolas,” lamenta.
Busca de direitos
A professora Gina Vieira, pesquisadora em educação e direitos humanos, reforça que exigir direitos não é caridade, mas uma busca legítima. “Os professores devem promover a diversidade e a celebração da identidade brasileira,” afirma. Se a lei não está sendo aplicada, as escolas precisam ser cobradas.
Avanços e celebrações
A professora Luiza Mandela, também pesquisadora e idealizadora de cursos de educação para a diversidade étnico-racial, destaca que a lei deu respaldo aos educadores que trabalham com cultura afro-brasileira. “Isso é um avanço,” diz.
A lei, segundo Vieira, é um resultado da luta histórica do movimento negro e deve ser celebrada por possibilitar iniciativas positivas nas estruturas educacionais. “Houve avanços como produções intelectuais negras voltadas para a temática étnico-racial,” ressalta.
Necessidade de aperfeiçoamento
Mandela e Vieira concordam que a legislação e sua aplicação ainda precisam ser melhoradas. “Faltam disciplinas obrigatórias para os cursos de licenciatura se aprofundarem nesses temas,” afirma Mandela. Vieira acrescenta que a aplicação da lei exige mudanças estruturais e políticas públicas.
Repertório e desafios
O tema tem sido cobrado em vestibulares, incluindo o Enem, cujo último tema foi “Desafios para a valorização da herança africana no Brasil.” Vieira questiona se os estudantes das escolas que não aplicam a lei têm repertório suficiente para escrever sobre o assunto.
O professor de sociologia Claudio Valente destaca o papel crucial da escola na socialização do indivíduo e a importância da lei. “Não tem como falar de Brasil e não tocar nos temas de cultura afro-brasileira,” afirma.
Pesquisa e política nacional
Pesquisa do Instituto Alana e Geledés em 2023 mostrou que sete em cada dez secretarias municipais de Educação não implementavam ações sobre a história e cultura afro-brasileira. Em resposta, o Ministério da Educação destacou avanços significativos, como o lançamento da Política Nacional de Equidade, Educação para as Relações Étnico-Raciais e Educação Escolar Quilombola.
Com informações Agência Brasil