O ano de 2024 foi marcado por desafios significativos tanto na política fiscal quanto na monetária. Os juros reais de 12 meses, calculados a partir da estrutura a termo da taxa de juros e das projeções de inflação da pesquisa Focus, atingiram cerca de 9,5%, com tendência de alta para 10%. Nem mesmo durante a crise política e econômica de 2014 a 2016 os juros reais ultrapassaram esse patamar. Esse cenário é consequência de políticas que indicam um caminho para o desequilíbrio econômico.
Manter juros reais em níveis tão elevados não é sustentável a longo prazo. O Brasil enfrenta dois possíveis caminhos: ajustar a política fiscal para permitir uma redução significativa nos juros ou enfrentar uma alta inflação que forçará a redução das taxas reais. Sem uma melhoria fiscal consistente, o custo de financiar a dívida pública continuará a crescer, pressionando ainda mais a economia.
Os superávits primários são essenciais para estabilizar as despesas públicas. No entanto, a lenta resposta do governo em implementar ajustes fiscais aumenta a incerteza, retardando o crescimento econômico e agravando as expectativas inflacionárias. Isso dificulta ainda mais a tarefa do Banco Central em controlar a inflação sem sacrificar a atividade econômica.
Apesar da alta taxa de juros, o mercado de crédito brasileiro mostra resiliência. O crescimento do crédito, combinado com níveis controlados de inadimplência, aponta para uma demanda robusta por financiamento. Empresas e consumidores parecem navegar bem nesse ambiente restritivo, levantando questões sobre a eficácia dos juros altos em frear o crescimento econômico. O mercado de trabalho também se mantém forte, com níveis recordes de emprego e um saldo positivo de contratações formais. A massa salarial continua a crescer, refletindo uma economia que, surpreendentemente, permanece vigorosa.
No setor externo, a atratividade do Brasil para o capital estrangeiro tem se enfraquecido, apesar dos juros altos. A saída de capital em dezembro foi recorde, pressionando a taxa de câmbio e levando o Banco Central a intervenções também em níveis recordes. Uma das maiores questões é como a atividade econômica e a inflação de serviços se mantêm elevadas, mesmo sob um regime de juros tão altos e restritivo. Setores como turismo, serviços pessoais e comércio continuam a crescer, sugerindo uma demanda interna resiliente.
Essa situação cria um paradoxo: a política monetária restritiva deveria desacelerar a atividade econômica e conter a inflação, mas os dados indicam uma economia que continua a expandir. Isso levanta preocupações sobre a eficácia das medidas de política monetária e a necessidade de políticas complementares para controlar a inflação sem prejudicar o crescimento.
Ao longo de 2024, as expectativas sobre o juro neutro — aquele que não estimula nem restringe a economia — mudaram significativamente. Inicialmente estimado em torno de 4,5%, o juro neutro agora é projetado para 5,5% ou até 6%. Essa revisão reflete uma realidade econômica mais complexa, onde fatores estruturais, como a inflação persistente e a rigidez fiscal, desempenham papéis cruciais. Um juro neutro mais alto indica que a economia pode precisar de um período prolongado de juros elevados para conter a inflação, prolongando o período de desaceleração econômica futura e exigindo uma coordenação cuidadosa entre as políticas fiscal e monetária.
A trajetória dos juros reais no Brasil demonstra a importância da coordenação entre as políticas fiscal e monetária. Acelerar a partir da política fiscal e “brecar” através da política monetária está levando a uma situação de desequilíbrio crescente. O governo precisa implementar ajustes fiscais significativos para estabilizar a dívida pública e restaurar a confiança dos agentes econômicos na sustentabilidade. Sem essas medidas, o Brasil corre o risco de entrar em um ciclo vicioso de juros elevados e inflação persistentemente alta, além da possibilidade de um desarranjo maior.
As escolhas feitas em 2025 serão cruciais para determinar o rumo da economia brasileira nos próximos anos. A responsabilidade fiscal e a coordenação eficaz entre as políticas monetária e fiscal são fundamentais para garantir uma trajetória de crescimento sustentável, juros mais razoáveis e evitar crises econômicas futuras. O tempo está se esgotando e o país precisa agir de forma decisiva para superar os desafios econômicos que se avizinham.
Com informações InfoMoney