Uma lista de chamada, em que a ordem alfabética indicava que os presentes deveriam se levantar. Os passos da cadeira do auditório da Escola Superior da Defensoria Pública do Estado até a mesa se tornaram caminhada rumo ao pódio, e a medalha foi ter a certidão de nascimento em mãos.
O que para pessoas cisgêneros (aquelas que se identificam com o gênero associado ao sexo biológico), se trata de só mais um papel, para eles e elas é o renascimento e a garantia de cidadania.
A ação realizada pela Defensoria Pública do Estado, em parceira com a Secretaria de Estado da Cidadania, Anoreg, Tribunal de Justiça, Defensoria Pública da União, Ministério Público de MS, ATMS e Coordenaria Municipal de Políticas para População LGBT+, iniciou em maio e terminou na entrega das retificações no mês em que se celebra o Orgulho LGBTQIA+. Cerca de 50 pessoas trans e travestis conseguiram ser quem são nos documentos. O processo que desde dezembro do ano passado, através da Lei Estadual n.º 6.183 de 26 de dezembro de 2023 já é gratuito, foi concluído rapidamente.
A cerimônia estava marcada para 9h30, mas teve quem tenha sido levada pela ansiedade a chegar com quase 1h de antecedência. Niah Valentina, de 22 anos, estava acompanhada da mãe, Graciela Leite e da amiga Jhulya. As três chegaram cedo, depois de uma noite em claro.
“Eu estou me sentindo como se tivesse levando uma filha ao altar. Emoção lá em cima, lá no topo, porque é um desejo dela sendo realizado, e o meu também”, descreve a mãe.
Para Niah, a partir do documento as pessoas vão passar a respeita-la. “Porque falam assim: ‘ah, você não é mulher porque sua certidão está escrito esse nome’. Então, eu ter o meu nome mesmo no papel é reafirmar para mim, cada vez mais, a minha identidade”, explica Niah Valentina.
O segundo a chegar foi Johnh Lucas Maldonado, se 27 anos. De camisa branca fechada até a gola, ele tentava conter a euforia que lhe transbordava pelos olhos. “Ontem, quando eu recebi a mensagem que estava tudo certo, que eu podia vir buscar, acho que eu fiquei meia hora chorando. Porque eu já tô com 27 anos e é muito chato, a gente estar num ambiente e a pessoa chamar pelo nosso documento”, narra.
Além do constrangimento, ficam para trás também as nomenclaturas “de batismo” e “social”, para dar lugar ao nome. “É a garantia da cidadania. Apesar das pessoas que estão à minha volta me respeitarem, me chamarem pelo meu nome social e tudo mais, agora acabou. É o meu nome e ponto“, resume.